Passou perto, diriam os ambientalistas, com respeito à recente frustração na votação do Novo (?) Código Florestal. Mas, enquanto muitos comemoram o adiamento da discussão, com aquela velha e conhecida ilusão brasileira de “vamos deixar para depois, que tudo acaba se resolvendo”, não percebemos que o Brasil já está todo devastado. Não, não estou falando de nossas florestas, cerrados, manguezais etc. Refiro-me ao país, de modo geral, como Nação que, sim, precisa conservar sua natureza, mas igualmente necessita consolidar seu parque produtivo. Essa devastação, que já se iniciara há bastante tempo, consolidou-se, firme e forte, nos últimos governos populistas e equivocados, colocando-nos na trilha do atraso, sem que muitos se apercebessem.
Comecei minha vida profissional na lavoura. Fui pioneiro da agricultura do Mato Grosso, hoje uma das maiores potências produtivas do Mundo. Escrevi meu nome na história e me orgulho disso. Mas, calma aí, antes de me enxergarem como um “desmatador” ou vilão do agronegócio, num arroubo de reacionarismo tão deletério como o que enxergamos na “bancada ruralista”, só pelo fato de que “estão do lado de lá”. Vamos deixar disso e passemos à reflexão, a partir de nossa capacidade humana de raciocinar. Assim, deixem-me explicar: Eu estava lá, no início dos anos de 1980 – viu como faz pouco tempo? – em busca do que se chama de “The adventure of a lifetime” ou a aventura de minha vida, motor de grande parte dos jovens de minha época. Por isso, como afirma meu amigo Maurício Verboonen, talvez eu seja a pessoa adequada para falar sobre tudo isso, pois estou aqui, agora, falando em conservação do ambiente, assunto que muitos sabem ser “minha praia”.
Naquele tempo, não era o primeiro milhão de dólares (ou Euros, ou Reais) que movia os aventureiros como eu. Eram os desafios de realização, de conquista de novas fronteiras. E era assim que chamavam o Mato Grosso, naquele tempo – Fronteira Agrícola. Assim, em vez de ficar de frente para o mar e de costas para o Brasil, decidi partir para aquele estado, que era verdadeiramente o Velho Oeste de nosso país. Dormindo sob lonas de plástico, cozinhando sobre fogão de lata de óleo e fazendo turnos de trabalho, junto com meus funcionários, sobre ruidosos tratores agrícolas, conheci sobre a dureza de se domar a natureza, aprendendo a respeitá-la, como dizia o filósofo Francis Bacon, há coisa de cinco séculos. Mas, antes que alguém volte ao ataque, devo informar: Não derrubei um só hectare de mata ou de cerrado, ainda que tenha sim aberto bastante área para a agricultura.
Quando cheguei ao Mato Grosso, peguei terras já derrubadas e, percebendo que ainda havia cerrado em pé, determinei sua manutenção, mesmo sem saber, na época, qualquer coisa sobre reservas legais (reservas florestais) ou áreas de preservação permanente (APPs). Boa parte da fazenda ficou intacta, mesmo se tratando das melhores terras agrícolas do Planeta, o que motivava críticas de meus pares, sobre decisão tão estranha: “Para quê manter esse matinho mirrado, se pode plantar e lucrar mais?” Pois, eis aí a chave daquilo que pensava, desde então, e sobre o que pretendo agora falar: PRODUTIVIDADE IMPORTA MAIS QUE PRODUÇÃO. Ou seja, melhor que produzir um monte de soja, com grandes custos financeiros e ambientais, se pode produzir mais e melhor, em menos áreas? Nessa equação, recentemente, entrou nova variável, quase tão importante quanto a produtividade no interior da fazenda – LOGÍSTICA, que significa mais ou menos: Levar o que produzimos até quem vai consumir.
É aí que chegamos ao meu ponto de vista sobre essa luta fratricida e destrutiva para o ambiente (que é de todos nós, agricultores e cidadãos). Lembro-me bem dos tempos da ditadura, quando o governo punha patrões e empregados um contra o outro, enquanto se dedicava, por trás das cortinas, a mergulhar o país num de suas piores jornadas em sua história: o expansionismo, a inflação e a dívida. Hoje, espertamente, o governo empurra agricultores e cidadãos para o confronto, enquanto escapa pela tangente das mais importantes discussões sobre o país que queremos ser. Identificando pólos aparentemente opostos, na conservação ambiental e na agropecuária, o grupo dos amigos encistados no poder se dedica às mais impressionantes negociatas, junto ao capital internacional, louco para entrar pelas nossas fronteiras, enquanto produtores gastam tempo, dinheiro e energia tentando garantir aparentes vantagens para sua classe.
O poder tem organização – e como! – para tratar o país como um grande shopping-center, mobilizando forças internas e externas (refiro-me à JD Participações e Consultorias, do Zé) para trazer capitais – SIM, CAPITAIS, aqueles que o PT tanto repudiava! – para abarrotar nosso caixa. Mas, praticamente nenhum esforço faz para garantir a infra-estrutura que tornará possível ao país aproveitar suas chances no cenário mundial. Isso significa, por exemplo, que sobram recursos abundantes para financiamento de qualquer lavoura, no Centro-Oeste, propiciando meios ao aumento nominal da produção. Porém, o governo patina, como um caminhão na lama das estradas do Mato Grosso, na tarefa de garantir a LOGÍSTICA e a qualidade do parque produtivo. É o governo, com sua desídia nos transportes, por exemplo, o grande responsável pela luta do agronegócio por mais terras.
Poucos sabem, nas grandes cidades, que uma saca de 60kg de soja devolve ao produtor de Mato Grosso, hoje, algo em torno de R$ 38,00, enquanto se paga por ela, no Paraná, próximo ao Porto de Paranaguá, por onde ela será enviada à Europa ou China, algo em torno de R$ 44,00. Uma diferença que chega a ser de quase 15%, em média, a menos, nas mãos do produtor mato-grossense. Além disso, devido às mesmas estradas e ferrovias – ou falta delas – os fertilizantes chegam ao Centro-Oeste custando muito mais do que no Sudeste. Devemos lembrar que os solos do Cerrado são fracos e sua capacidade produtiva se deve à topografia plana e disponibilidade de terras, jamais à sua fertilidade. Assim, gasta-se em adubos muito mais do que aqui, onerando a produção. Como a agenda de INVESTIMENTOS é dura para os agricultores, pela taxa de juros aqui praticada, fica difícil aumentar a PRODUTIVIDADE... Ou seja, por essas contas, melhor abrir mais áreas. Afinal, quem manda é a economia de escala – QUANTO MAIOR O EMPREENDIMENTO, MAIOR O RETORNO, POR CAUSA DAS PEQUENAS MARGENS DE LUCRO.
Com suas lavouras devastadas pela ausência de políticas sérias de transporte e agricultura, os produtores somente encontram uma solução para seus problemas: A DEVASTAÇÃO DAS FLORESTAS E CERRADOS. Ou seja, enquanto dormimos tranquilos, pelo adiamento da votação do Código Florestal, consolida-se a devastação silenciosa de nossas florestas e lavouras. Deveríamos voltar logo à discussão de nossa Lei Ambiental Maior, tendo a consciência de que o país não abrirá mão de um só hectare de seu parque produtivo atual. Se abrirmos os olhos, poderemos encontrar via de compensação pela devastação já realizada e, com muito esforço, impedir que prossiga este nefasto processo de irmão destruindo irmão; cidade versus campo; ambientalistas contra ruralistas. O que queremos é um país melhor. Só que, para isso, talvez não possamos contar com nossos atuais governantes. Espero que tenhamos tempo para mudá-los.
Acima - Colheita de algodão, no Mato Grosso;
Abaixo - Aspecto de uma pastagem no Centro-Oeste;
Adiante - Por de sol, no Mato Grosso
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