Nidularium ferdinando-coburgii na natureza
É muito comum, na comunidade de amantes da Botânica, não
pertencentes à Academia (universidades e instituições de pesquisa), a
circulação de nomes de plantas em que, ao nome binomial, apõem um terceiro
nome, dito como VARIEDADE. Na grande maioria
das vezes, a tal “variedade” nada
mais representa que uma FORMA da planta, um
clone da espécie cultivada, que apresentou características interessantes e, por
isso, foi propagada vegetativamente, à exaustão, para suprir o mercado. Assim,
na Botânica, essas plantas devem ser chamadas de FORMA, como dito acima.
As verdadeiras VARIEDADES
são populações de plantas de determinadas espécies, que subsistem na natureza,
usualmente ocupando microrregiões geográficas distintas da forma típica. Sim,
elas um dia saíram daquela dita FORMA TÍPICA da planta, devido a mutações ou
seleções ocasionais, que geraram indivíduos adaptados a certas mudanças ou
particularidades do meio, logrando se perpetuarem e ocuparem território
próprio. Existem teses que aventam a hipótese de que certas variedades de
plantas terem sido, num passado remoto, a própria planta TIPO e que aquilo que
encontramos hoje, em maior número e mais numerosamente representado, ser a
VARIEDADE, que prosperou e colonizou as maiores áreas de ocorrência.
Isso não é nada provável, tão somente por questões
estatísticas, que reputam muito mais provável que a variedade típica, mais
numerosa e bem distribuída, obrigatoriamente assimilaria velhas populações
menos importantes. De todo modo, como não é nosso blog um compêndio de genética
evolutiva, servimo-nos de nossas primeiras linhas apenas para esclarecer bem o
que é realmente uma VARIEDADE e o que representa uma FORMA.
Em Petrópolis, tanto quanto em grande espaço territorial da
floresta atlântica de altitude, no Brasil Sudeste, ocorre uma bromélia que se
torna característica dessa faixa ecológica – Nidularium ferdinando-coburgii.
Nas florestas da região, especialmente nos vales mais abrigados, acima dos
1.000m de altitude, geralmente nas proximidades de cursos d’água murmurantes,
essa bromélia assume importância capital, surgindo como espécie mais numerosa.
Roseta e flores de Nidularium ferdinando-coburgii
Ela vegeta principalmente no terço inferior dos troncos e
galhos das árvores e sobre o solo, por cima de matacões de pedra, ou meramente
na manta de folhas secas que cobre o chão úmido das matas de altitude. Na
primavera, principalmente, deixa surgir uma coroa de folhas róseo-avermelhadas,
no centro da roseta (coisa comum às bromélias deste gênero), entre as quais
emergem flores arroxeadas, com
pétalas fechadas e margeadas por linhas delicadamente alvas (ver fotos). Essas
coroas vistosas servem para atrair aves e insetos, mas também para chamar
atenção dos amantes de plantas, que a reconhecem de pronto, em meio ao caos da
floresta densa.
Nidualrium ferdinando-coburgii apresenta variações clonais, que
a fazem parecer, às vezes, plantas distintas. Também é comum, em vista da
famosa plasticidade de formas desta família botânica (Bromeliaceae), que
pensemos ter encontrado “variedades” da espécie, neste ou naquele morro, o que
termina por se revelar equívoco, ao cultivarmos essas plantas, em condições
diferentes daquela do habitat, quando todas convergem para um mesmo padrão.
Florescimento de Nidularium ferdinando-coburgii na coleção do JARDIM FITOGEOGRÁFICO
Na coleção de plantas do JARDIM FITOGEOGRÁFICO, Nidularium ferdinando-coburgii vegeta de forma idêntica à de seu
habitat, até por terem sido plantadas em fac-símiles destes ecossistemas, que
ocorrem poucos quilômetros dali. Por serem plantas nativas, sua tendência é de
que se dispersem naturalmente, na floresta recuperada da coleção. Nesta mesma
condição, possuímos uma virtual VARIEDADE de Nidularium ferdinando-coburgii,
que coletamos na região, há muitos anos, exatamente para esclarecer-lhe a
identidade. Essa variedade, em fase de descrição botânica, pelo taxonomista de
bromélias Ivo de Azevedo Penna,
apresenta a coroa de folhas centrais absolutamente verde, mesmo em
estágio de florescimento, característica que havíamos observado, em seu habitat
nativo, e que se manteve imutável, em diversas condições de cultivo, ao longo
dos últimos anos.
Nidularium ferdinando-coburgii Wawra variedade viridis
Penna habita certo vale da Serra dos Órgãos, onde somente ela ocorre,
inexistindo populações da planta típica. Quando a encontramos, ficamos intrigados
com a ausência de pigmentação violácea, em todas as plantas que encontramos,
floresta afora. Coletamos diversos exemplares jovens e imaturos, como forma de
nos certificarmos que as progênies em curso manteriam essa estranha
característica. Todas as plantas desenvolveram a coroa esverdeada,
característica que jamais perderam, ano após ano, mesmo depois de sua
propagação vegetativa, que originou diversas plantas, mantidas até hoje em
locais distintos e acompanhados.
Nidularium ferdinando-coburgii variedade viridis no habitat
A planta também apresenta aspecto pouco mais robusto de
folhas e brácteas, diferindo assim da variedade típica, cujas folhas são
levemente mais afiladas. Porém, nenhuma dessas variações morfológicas foi
capaz, segundo Ivo Penna, de sustentar pretensões taxonômicas de elevá-la a
espécie distinta. Então, antes de nos apressarmos em ver variedade e novas
espécies, nas plantas que nos vêm às mãos, tratemos sempre de conhecer suas
populações naturais e sua ecologia. Sem isso, estaremos constantemente
inventando nulidades científicas.
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