Periquito-maracanã (Ara maracana)
– devorando os frutos do camboatá
No início dos anos 1990, quando realizava minhas primeiras
consultorias em meio ambiente, em Petrópolis, não havia Google Earth, mapas
digitais, nada disso. Trabalhávamos, invariavelmente, com velhas cartas
geográficas 1:50000 do IBGE, que eram objetos de desejo de todos, sendo
vendidas numa lojinha da rua Senador Dantas, no Rio; ou conseguíamos imensas
cartas 1:10000 da FUNDREM – Fundação para o Desenvolvimento da Região
Metropolitana do Rio de Janeiro, que uns emprestavam para os outros, através de
arcaicas “cópias a metro”, obtidas na extinta e memorável Multicópias, na Praça
D. Pedro, em Petrópolis.
Bons tempos, tempos de muita emoção: trabalhar com meio
ambiente era tarefa investigativa das mais duras, que exigiam extrema
capacidade de observação e atenção. Tudo bem, não podemos reclamar dos imensos
avanços, desde então. Hoje, tudo se resolve a um toque no computador, com
modernos sistemas de geoprocessamento, ou até mesmo através do voo de um drone, aqueles mini-helicópteros, com
câmeras espetaculares, que substituíram enormes aviões, pesados com a carga de
câmeras analógicas, cujos rolos de filme tinham que ser revelados e
interpretados, em trabalhos de aerofotogrametria caríssima e que, no final,
nada mais eram que arquivos analógicos. Mas, naqueles venturosos tempos,
tínhamos surpresas quase poéticas, ao lidar com aquelas cartas geográficas.
Uma dessas belas experiências, da qual jamais esquecerei,
foi meu primeiro contato mais objetivo com uma árvore que viria a saber se
tratar de um dos mais importantes sustentáculos da fauna da Floresta Atlântica
– o camboatá
(Cupania
vernalis), da família Sapindaceae, a mesma do guaraná, com o qual,
aliás, seus frutinhos se parecem muito. Eu fazia um levantamento a respeito de
uma área, em Pedro do Rio, distrito de Petrópolis, onde se desejava implantar
um condomínio. Minha tarefa era de elaborar um zoneamento ambiental, que
determinasse as melhores maneiras de se desenhar a mancha urbanística, para
causar os menores impactos ao meio.
Minha interpretação, é claro, se baseava numa então recente
carta da Prefeitura de Petrópolis, em escala 1:10000, que trazia importantes
detalhes geográficos daquela localidade. A propriedade, ficava situada numa
suposta Serra das Cambotas,
disjunção da Serra da Maria Comprida, que acompanha o traçado da Rodovia BR040.
Aquilo me intrigava: de onde diabos advinha aquele nome tão singular – Serra
das Cambotas? Cambotas são cambalhotas! Teriam despencado de seus aclives
outros consultores, ou mateiros?
O espírito investigativo despertava em mim a curiosidade de
saber a origem do nome daquelas montanhas. Consegui, então, uma antiga folha da
FUNDREM, na qual constava a toponímia original, que certamente havia sido
descuidadamente copiada pelos cartógrafos, que elaboraram a carta da
Prefeitura: SERRA DOS CAMBOATÁS.
Examinando a Serra dos Camboatás, não tive dificuldades para
entender de onde vinha a referência dos mapas: os camboatás (Cupania
vernalis) eram extremamente numerosos, dominavam grande parte das matas
regenerativas, que ainda existiam na propriedade. Claro que essa árvore ficou
estampada em minha memória e se tornou objeto de minha imediata atenção, em
todas as partes que eu fazia meus muitos trabalhos.
Na floresta recuperada do JARDIM FITOGEOGRÁFICO,
o camboatá é espontâneo, como seria de imaginar. Quando começamos a recuperação
da floresta, em 2008, já havia um pé jovem dessa árvore, muito próximo de nossa
casa. Hoje, cerca de oito anos depois, transformou-se numa planta relativamente
frondosa, que floresce no final do inverno e frutifica exatamente agora, no
início da primavera, quando a maioria das aves estão nidificando e procriando.
Desnecessário falar muito sobre a grande diversão que é acompanhar, de nossa
janela, a festa das aves, quando chegam para o banquete.
A evidente palatabilidade e a suposta fonte de energia que
representam os frutos do camboatá confirmam a suprema importância ecológica
desta árvore que, como eu mesmo afirmava, nos textos de meus diversos projetos
de reflorestamento, das Décadas de 1990 e 2000, “não podem faltar, nas listas
de espécies a serem sugeridas, nos projetos de recuperação de áreas degradadas”.
O jacu (Penelope
obscura bronzina) chega a dormir nos galhos do camboatá, para amanhecer
em meio ao atraente farnel
Até os esquilos ou
caxinguelês (Sciuris ingrami) visitam o camboatá, para variar sua dieta
usual de coquinhos e frutos verdes
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