quarta-feira, 12 de outubro de 2016

PLANTAS DO JARDIM FITOGEOGRÁFICO – CAMBOATÁ: SUSTENTO DA FAUNA




Periquito-maracanã (Ara maracana) – devorando os frutos do camboatá

No início dos anos 1990, quando realizava minhas primeiras consultorias em meio ambiente, em Petrópolis, não havia Google Earth, mapas digitais, nada disso. Trabalhávamos, invariavelmente, com velhas cartas geográficas 1:50000 do IBGE, que eram objetos de desejo de todos, sendo vendidas numa lojinha da rua Senador Dantas, no Rio; ou conseguíamos imensas cartas 1:10000 da FUNDREM – Fundação para o Desenvolvimento da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, que uns emprestavam para os outros, através de arcaicas “cópias a metro”, obtidas na extinta e memorável Multicópias, na Praça D. Pedro, em Petrópolis.

Bons tempos, tempos de muita emoção: trabalhar com meio ambiente era tarefa investigativa das mais duras, que exigiam extrema capacidade de observação e atenção. Tudo bem, não podemos reclamar dos imensos avanços, desde então. Hoje, tudo se resolve a um toque no computador, com modernos sistemas de geoprocessamento, ou até mesmo através do voo de um drone, aqueles mini-helicópteros, com câmeras espetaculares, que substituíram enormes aviões, pesados com a carga de câmeras analógicas, cujos rolos de filme tinham que ser revelados e interpretados, em trabalhos de aerofotogrametria caríssima e que, no final, nada mais eram que arquivos analógicos. Mas, naqueles venturosos tempos, tínhamos surpresas quase poéticas, ao lidar com aquelas cartas geográficas.

Uma dessas belas experiências, da qual jamais esquecerei, foi meu primeiro contato mais objetivo com uma árvore que viria a saber se tratar de um dos mais importantes sustentáculos da fauna da Floresta Atlântica – o camboatá (Cupania vernalis), da família Sapindaceae, a mesma do guaraná, com o qual, aliás, seus frutinhos se parecem muito. Eu fazia um levantamento a respeito de uma área, em Pedro do Rio, distrito de Petrópolis, onde se desejava implantar um condomínio. Minha tarefa era de elaborar um zoneamento ambiental, que determinasse as melhores maneiras de se desenhar a mancha urbanística, para causar os menores impactos ao meio.

Minha interpretação, é claro, se baseava numa então recente carta da Prefeitura de Petrópolis, em escala 1:10000, que trazia importantes detalhes geográficos daquela localidade. A propriedade, ficava situada numa suposta Serra das Cambotas, disjunção da Serra da Maria Comprida, que acompanha o traçado da Rodovia BR040. Aquilo me intrigava: de onde diabos advinha aquele nome tão singular – Serra das Cambotas? Cambotas são cambalhotas! Teriam despencado de seus aclives outros consultores, ou mateiros?

O espírito investigativo despertava em mim a curiosidade de saber a origem do nome daquelas montanhas. Consegui, então, uma antiga folha da FUNDREM, na qual constava a toponímia original, que certamente havia sido descuidadamente copiada pelos cartógrafos, que elaboraram a carta da Prefeitura: SERRA DOS CAMBOATÁS.

Examinando a Serra dos Camboatás, não tive dificuldades para entender de onde vinha a referência dos mapas: os camboatás (Cupania vernalis) eram extremamente numerosos, dominavam grande parte das matas regenerativas, que ainda existiam na propriedade. Claro que essa árvore ficou estampada em minha memória e se tornou objeto de minha imediata atenção, em todas as partes que eu fazia meus muitos trabalhos.

Na floresta recuperada do JARDIM FITOGEOGRÁFICO, o camboatá é espontâneo, como seria de imaginar. Quando começamos a recuperação da floresta, em 2008, já havia um pé jovem dessa árvore, muito próximo de nossa casa. Hoje, cerca de oito anos depois, transformou-se numa planta relativamente frondosa, que floresce no final do inverno e frutifica exatamente agora, no início da primavera, quando a maioria das aves estão nidificando e procriando. Desnecessário falar muito sobre a grande diversão que é acompanhar, de nossa janela, a festa das aves, quando chegam para o banquete.

A evidente palatabilidade e a suposta fonte de energia que representam os frutos do camboatá confirmam a suprema importância ecológica desta árvore que, como eu mesmo afirmava, nos textos de meus diversos projetos de reflorestamento, das Décadas de 1990 e 2000, “não podem faltar, nas listas de espécies a serem sugeridas, nos projetos de recuperação de áreas degradadas”.



O jacu (Penelope obscura bronzina) chega a dormir nos galhos do camboatá, para amanhecer em meio ao atraente farnel

Até os esquilos ou caxinguelês (Sciuris ingrami) visitam o camboatá, para variar sua dieta usual de coquinhos e frutos verdes


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