domingo, 13 de fevereiro de 2011

VERANICO – A SECA DO ALTO VERÃO NO SUDESTE

          Temos enfrentado muitas surpresas climáticas e meteorológicas, não somente no Rio de Janeiro, mas em todo o país, quiçá no inteiro Planeta. Porém, deve ser lembrado, oportunamente, que o Clima tem dessas coisas mesmo. Ainda estamos discutindo, acaloradamente, nos meios acadêmicos e para-acadêmicos, se os duros eventos meteorológicos ocorridos em janeiro, na Região Serrana do Rio, representaram realmente um fato sem precedentes, ao menos na História do Brasil, que já remete a 510 anos. Mas, enquanto se debate a recorrência de chuvas da ordem de 200mm, em período de cerca de duas horas, como parece ter sido o caso na Serra Fluminense, algo realmente extraordinário, devemos deixar claro um aspecto fundamental, em climatologia: O Clima de determinadas regiões possui padrões previsíveis, mesmo que submetidos às naturais flutuações, que o fazem variar, de ano para ano, de década para década e mesmo de século para século. Flutuações são essas variações que percebemos, com nosso olhar pessoal, quando temos um verão mais quente que outro, com mais ou menos chuva, ou mesmo mais ou menos frio, no inverno. São diferentes – e muito – das apregoadas mudanças climáticas, que pressupõem diferenciações profundas nos padrões conhecidos e que podem ou não estar ocorrendo, em nosso Planeta.
          Pois falo aqui, agora, de um fenômeno que tem assustado muitas pessoas, nestes últimos dias, que parece para alguns um tipo de coisa extraordinária e, na visão de outros poucos, até mesmo um sinal alarmante das mudanças climáticas em curso. Refiro-me à prolongada seca, acompanhada de forte calor, que tem se abatido sobre nosso Estado, ocasionando incêndios florestais, tais como o do Parque Ecológico da Prainha, além de outros urbanos, como o que destruiu por completo alguns barracões de escolas, na Cidade do Samba, Zona Portuária do Rio. Trata-se de um padrão bastante previsível, na climatologia fluminense, ocorrendo com freqüência considerável, entre os dias 15 de janeiro e 15 de fevereiro, todos os anos. Chama-se VERANICO e sua ausência, em determinados anos, esta sim, pode ser considerada algo excepcional. Porém, tendo se sucedido às chuvas descomunais e destruidoras de12 de janeiro, não podiam deixar de ser observadas com certo susto, pelos não iniciados nas ciências naturais.
          O Veranico é um domínio ocasional de altas pressões atmosféricas, quando predominam ventos descendentes, empurrando ar seco contra o solo, dificultando assim a ascensão de massas úmidas e a conseqüente formação de nuvens – que produzem as chuvas. Nesta época do ano, situamo-nos na retaguarda do sistema equatorial-amazônico que, encontrando-se com as massas de ar do Atlântico Sul, forma um corredor de umidade conhecido como Zona de Convergência do Atlântico Sul (ZCAS). A ZCAS é exatamente aquela que, dias atrás, encontrava-se sobre o Sudeste, causando as chuvas que atormentaram a população do RJ, SP, MG e ES. A ZCAS e que se deslocou agora para a Região Sul deixando-nos sob a forte seca que ora enfrentamos, acompanhada de intenso calor, por encontrarmo-nos exatamente no Alto Verão. O Veranico é normal e não deve assustar ninguém. Daqui a alguns dias, a ZCAS se enfraquecerá, enquanto as chuvas do final do verão – as famosas águas de março – fecharão a estação quente de 2010/2011.
          O clima sofre suas flutuações, ano após ano, mas seus padrões ainda permanecem os mesmos, a se considerar os registros existentes, desde o Século XIX, mesmo tendo evoluído bastante a metodologia de medições e previsões. Mesmo que o veranico nos cause certos desconfortos, assim como as chuvas, quando em exagero, temos que nos curvar, humildemente, diante da grandiosidade da Natureza, que dá um pouco de cada coisa, em doses pré-estabelecidas, a cada ser que habita o Planeta. Temos que admitir que não estamos sozinhos na Barca Terrestre e que existem outras formas de vida, que necessitam de quantidades específicas de chuvas, secas, ventos e radiação solar, por mais que essas doses alheias, por vezes, nos incomodem um pouco. Podemos ter absoluta certeza de que, neste exato instante, enquanto nos esbaforimos, desagradados pelo calor intenso e falta de chuvas, outros habitantes do Planeta comemoram sua dose certa, que lhes propiciará reprodução, crescimento e sua necessária perpetuação.
          Deveríamos sim adequar nossas ambições de dominação sobre a biosfera às medidas que efetivamente a Natureza nos condicionou crescer. Não podemos continuar proliferando, desmesuradamente, ocupando todo e qualquer espaço existente sobre a Terra, e desejando ainda que não sejamos atropelados por torrentes d’água, terremotos, incêndios e furacões, que sempre existiram, mas que nos passavam ao largo, em tempos de menor população humana. É hora de darmos uma parada para pensar, olhando as flores e bichos que nos cercam, entendendo que o momento agora é deles. Precisamos nos deter, diante da linha, aguardando que o trem da Natureza passe, com sua força descomunal, para podermos então, depois do último vagão, seguir nosso caminho, com toda calma.



A orquídea Cattleya bicolor floresce nas matas de Petrópolis, no exato momento em que a região se submete aos mais severos momentos de seca, no veranico do Alto Verão. A diversidade obriga alguns a tolerar condições duras para si, enquanto outros usufruem de seus instantes ótimos.

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