sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

ORGANIZANDO UMA COLEÇÃO DE PLANTAS – PARTE I: CADASTRANDO EXEMPLARES


Canteiro 02 do Setor Muro Dianteiro Sudoeste do Jardim Fitogeográfico, em Petrópolis, Rio de Janeiro


Você também é um amante de plantas? Tem espaço em sua casa? Coleciona plantas? Muito provavelmente, se você está lendo meu texto, será este o caso. Sim, pois a maior parte dos meus amigos da internet, ou representa pesquisadores, ou amantes de plantas, muito embora vinhos também façam parte dos interesses comuns com muitos deles. Então, se você já é um colecionador experiente, talvez pegue algumas dicas nesta postagem; se está começando, ou quer melhorar o nível da coleção, aproveite um pouco da minha experiência, para organizar suas plantas.

Antes de mais nada, é necessário avaliar os propósitos de sua coleção. Pode ser que você apenas goste de juntar plantas, aqui ou ali, levando-as para seu espaço e cultivando-as com carinho, para enfeitar o ambiente. Mas, posso apostar que não! Você é antes de tudo um COLECIONADOR! Colecionaria selos, se fosse o caso; juntaria vinhos, se os apreciasse; enfim, nada de mais, as pessoas gostam de colecionar coisas, é muito bom. Frederico Carlos Hoehne, um dos mais importantes naturalistas do Século XX, afirmava que “todo bom menino começa a colecionar coisas, quando começa a se interessar pelo mundo”. Não fui eu quem disse! Foi Hoehne: COLECIONAR FAZ BEM!

Assim, se você está querendo organizar sua coleção de plantas, é sinal claro de que o interesse botânico surgiu em você e chegou a hora de saber mais sobre cada um dos itens que você juntou; e mais ainda sobre aqueles outros que pretende arrumar por aí. Então, é hora de focar e organizar sua coleção. Se você gosta das plantas que coleciona, deve ter em mente, acima de tudo, que os objetos de seu desejo e devoção precisam ser mais conhecidos, protegidos e até propagados, para que não desapareçam. Sua coleção deve estar apta ao estudo. Pode ser que apenas você se interesse por essas plantas, sendo assim razoável que se torne fácil consultar os dados sobre elas. Mas, é muito possível que ela passe a representar interesse para pesquisadores e estudiosos. Então, é bom que tome alguns cuidados, a saber.

Obtendo Plantas:
Se você coletou uma planta na natureza, e espero que tenha cuidado para apenas retirar um propágulo, ou somente uma amostra, preservando o restante da população, deve anotar cuidadosamente o lugar onde a encontrou (coordenadas geográficas, dados sobre o habitat, forma de crescimento etc.), além de tirar boas fotos da população natural. Uma boa etiqueta ajudará a organizar as plantinhas que conseguiu, até que vão para seu cultivo. A identidade da planta é seu dado mais importante e não poderá ser perdida jamais. Eu mesmo, por força de inúmeras mudanças de endereço, perdi diversas identidades de plantas e hoje olho para elas, desapontado por não poder mais resgatar tão importante informação.

Acima – Orlando Graeff, no início dos anos 1980, no orquidário da Reserva Natural da Fazenda Ipanema, no Mato Grosso, coleção completamente desaparecida, anos depois – perdas irreparáveis para a cultura e a ciência

Cadastrando sua Planta:
Assim como nós temos ID e CPF, as plantas deverão receber um número de identificação, que jamais será mudado. O nome dela é menos importante do que essa numeração, que será indexada a uma ficha, ou listagem. Há quem defenda até que cada indivíduo seja cadastrado com um número, exclusivamente. Se você andou apanhando plantas demais (o que espero não ser o caso), realmente deverá cadastrá-las individualmente, mesmo que se pareçam muito. A MORFOLOGIA É UMA ARMADILHA e é bastante comum que duas ou mais de suas plantas, que você pensava se tratarem da mesma coisa, se revelem espécies diferentes. Então, fica a seu critério essa escolha. Especialmente bromélias podem te pregar este tipo de peça, assim, CUIDADO!

O número da planta não mudará nunca mais! Isso é fundamental. Não se esqueça: há números de sobra, até o infinito. Então, se você coletou uma planta, ou a recebeu de alguém, não importa, atribua-lhe um número, faça sua ficha e, mesmo que ela morra, ou desapareça, não mais utilize este número. Se conseguir outra “igual”, confira-lhe um novo número. Alguém poderá, um dia, realizar um trabalho científico sobre sua plantinha, quem sabe até uma espécie nova. Então, ele citará o material examinado, acompanhado do número de sua coleção. Isso não poderá mudar, sob o risco de colocar por terra todo um trabalho de pesquisa.

Se você conhecer minha bromélia Alcantarea vinicolor, cadastrada sob o número 342, saberá que foi coletada em Pedra Azul, no Espírito Santo, na Década de 1990, pelo naturalista Pedro Nahoum, tendo sido cedido a mim um exemplar, em janeiro de 2000. Daqui a dez anos, se você quiser saber mais sobre esta planta, bastará citar este número e pronto, você terá encontrado a mesma exata bromélia, sem riscos de engano... A não ser que ela tenha morrido! Bem, daí é outro assunto. Afinal, falamos de seres vivos e sobre isso, falaremos numa das próximas postagens.




Acima – A bromélia Alcantarea vinicolor, na coleção do Jardim Fitogeográfico, em Petrópolis

Como Cadastrar:

Enfim, sabendo as boas regras para dar entrada a uma planta em sua coleção organizada, você terá que saber como realizar este cadastro. Algumas coisas são realmente fundamentais e devem constar de seu cadastro: nome da planta (se você já souber); nome vulgar (se for conhecido); família botânica a que pertence; origem do seu exemplar; local de obtenção ou dados do local ou estabelecimento comercial, se tiver comprado; data de obtenção; e as observações gerais sobre a planta, que poderão relacionar dados geográficos, hábito da planta etc. Essa listagem poderá ser feita num programa ou aplicativo específico, ou simplesmente num texto de Word, como é efetuado aqui, no Jardim Fitogeográfico, há muitos anos.

Seja lá como o fizer, tome um imenso cuidado: faça backups regularmente e, se possível, imprima em papel, guardando em local apropriado. Como exemplo de uma ficha de planta, posso oferecer o seguinte:

443 – Bromelia horstii Werner Rauh – Família Bromeliaceae
Origem: Jaciara, Mato Grosso;
Data de Obtenção: 1999, durante viagem à região do Balneário da Cachoeira da Fumaça, juntamente com Luiz Campos Filho;
Observações: Planta extremamente agressiva e guarnecida de espinhos, desenvolvendo intumescimento, na base do caule, que pode permanecer como órgão de sobrevivência, no ambiente pedregoso (saxícola), no qual a planta vive, sendo comuns os incêndios florestais. Produz vistosas inflorescências, com lindas flores violáceas, sobre brácteas rosadas.

Essa planta foi encontrada por nós (o saudoso Luiz Campos Filho – que seria nosso Diretor Administrativo, na Sociedade Brasileira de Bromélias-SBBr, entre 2001 e 2003), enquanto investigávamos a natureza de uma bela região da borda da Serra de São Vicente, no Mato Grosso, já próximo ao Pantanal, onde seria desenvolvido um projeto turístico. Os dados sobre a planta constam da ficha, tendo sido tiradas muitas fotos, que ajudaram na identificação da espécie, feita pelo grande naturalista Eddie Esteves.

Adiante – Bromelia horstii, no habitat, em Mato Grosso (foto em filme negativo), e suas flores, em cultivo, anos depois, na coleção do Jardim Fitogeográfico





Se você tem iniciação botânica, na área de Taxonomia, também poderá coletar material para fazer uma EXSICATA, ou seja, uma amostra da planta seca, para depósito num herbário de sua confiança. Esse procedimento é ainda mais importante do que a coleta de material vivo, para compor sua coleção, pois poderá conferir validade científica para futuras listagens de flora, assim como para a descoberta de novas espécies. Mas, isso requer conhecimento e preparo técnico prático, que não é objeto de nossa conversa de hoje. Então, vamos lá: nada de malbaratar sua expedição, ou sua nova aquisição de plantas. Cadastre acertadamente, para que a ciência tire merecido proveito de sua coleção!


Acima – Canteiro 01 do Setor Muro Dianteiro Sudoeste, no JARDIM FITOGEOGRÁFICO

PRÓXIMA POSTAGEM: MANTENDO SUA PLANTA NA COLEÇÃO

Sugestões de leitura neste blog:


E se todos fizessem isso? Coleta ou Extrativismo? Uma Ameaça às Plantas Brasileiras - http://orlandograeff.blogspot.com.br/2013/01/e-se-todos-fizessem-isso-coleta-ou.html